
EFEITO DO ESCOAMENTO DA ÁGUA DE CHUVA EM
DIFERENTES COBERTURAS
INTRODUÇÃO
O Semi-Árido brasileiro é considerado um dos mais úmidos do planeta, visto que, a precipitação pluviométrica é, em média, de até 800 mm, podendo ocorrer anos com valores de precipitação acima de 1000 mm, o que significa um volume de água considerável para uma região onde há deficiência e irregularidade na distribuição de chuvas que provocam secas periódicas.
Para suprir a deficiência de água para diferentes usos no meio rural, como consumo humano, animal e produção agrícola, diferentes alternativas tecnológicas têm sido desenvolvidas e/ou adaptadas às condições do semi-árido brasileiro visando à captação e o armazenamento da água de chuva, com destaque para cisterna rural, que pode aumentar a disponibilidade e melhorar a qualidade das águas utilizadas pelos agricultores.
A convivência com a escassez de água em regiões áridas e semi-áridas exige medidas de gestão e práticas de uso da água apropriadas. Para reduzir os efeitos dessa escassez, a Embrapa Semi-Árido tem disponibilizado diferentes alternativas tecnológicas por meio da construção de pequenas estruturas hídricas como cisterna, barragem subterrânea, captação in situ, pequenas barragens para uso na irrigação de salvação, que objetivam a captação e o armazenamento e o uso das águas de chuva (GNADLINGER et al. 2007). Contudo, a captação e o armazenamento de água de chuva para consumo familiar em cisternas é considerado uma técnica simples e eficiente e de uso secular. Embora o volume de água captado seja um fator que depende da eficiência do escoamento superficial das áreas de captação.
Segundo SILVA et al., (1984), define-se o coeficiente de escoamento superficial como sendo a relação existente entre o volume escoado e o volume precipitado. Esse coeficiente varia com a duração da chuva, com sua intensidade e com as condições físicas da área de captação, sendo adotado para cobertura com telha de barro o valor de 0,75%.
No Semi-Árido a maioria das residências da zona rural tem áreas de captação entre 60 e 70 m2, e apresentam capacidade de captar elevados volumes de água de chuva, mesmo nos anos de precipitação abaixo da média, o que pode suprir as necessidades das famílias com até seis pessoas. MEIRA FILHO et al. (2009), estudando o desenvolvimento de um modelo de captação de água de chuva para esta região seca do Nordeste, demonstrou que das residências que dispõem de sistemas de captação com os elementos mínimos necessários, apenas 16% armazenam água suficiente para seu abastecimento durante todo o ano. Este baixo índice é decorrente das precárias condições do sistema de condução de água (calhas e tubos). Dessa forma, este trabalho teve como objetivo testar diferentes tipos de áreas de captação, visando à obtenção de resultados que indiquem o mais adequado sistema de captação de água de chuva.
MATERIAL E MÉTODOS
Este trabalho foi conduzido na Estação Experimental da Caatinga, da Embrapa Semi-Árido, no período de dezembro de 2007 a abril de 2009. O clima da região é classificado como semi-árido quente BSw’h, conforme classificação de Köeppen. Apresenta temperatura média anual de 26,3 ºC e precipitação média anual são de 566,7 mm, (MOURA et. al., 2007), distribuída de forma irregular no tempo e no espaço. Para realização desta pesquisa, procedeu-se a construção de uma laje de 10 cm de espessura, sobre o telhado de uma cisterna e dividido em quatro áreas de captação com declividade de 10%, aproximadamente. As dimensões de cada área de captação foram de 0,96 m x 3,4 m, totalizando 3,264 m2. Os materiais utilizados em cada área de captação foram área 1: cobertura de argamassa de cimento e areia, área 2: cobertura com telhas de cerâmica; área 3: cobertura com telha de fibrocimento; e área 4: cobertura com lona plástica de polietileno. Na extremidade de cada área foi colocado um tudo PVC interconectando esta área a uma caixa d”água com capacidade para 500 litros de água. A coleta de água foi realizada logo após cada evento de precipitação ocorrida no local do experimento e medida por meio de pluviômetro instalado. Para estimar os volumes potenciais de água chuva escoados em cada área, tomou-se por base que 1 mm de chuva corresponde a um litro de água por cada m2 de área (1 mm=1 litro.m2). A determinação do coeficiente de escoamento superficial (R) é calculado pela relação entre o volume escoado (VE) e o volume precipitado (VP), cujos valores variam de 0 a 1.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os eventos de chuva ocorridos no período de dezembro de 2007 a abril de 2008, em que pode ser observado que para as chuvas de baixa intensidade, a área 1 (captação de argamassa de areia e cimento) e a área 2 (telhado de cerâmica) absorveram mais água do que os demais tipos de áreas, ocasionando desta forma um retardo no escoamento da água de chuva para as caixas coletoras, como pode ser observado nos dias 8 e 9 de dezembro de 2007, quando ocorreu uma precipitação de 0,5 e 0,3 mm, respectivamente. Os coeficientes de escoamento na chuva do dia 8 de dezembro foram de: 0,29% para a área 2 (cobertura com telhas de cerâmica); 0,48% para área 3 (cobertura com telha de fibrocimento); e de 0,92% para área 4 (cobertura com lona de polietileno). O coeficiente obtido na cobertura com a lona plástica encontra-se no intervalo determinado por TOMAZ (2007) para este tipo de cobertura. Na área 1 (cobertura de argamassa de cimento) não houve escoamento nesta chuva. Valores semelhantes foram obtidos no dia 20 de março e 21 de abril quando ocorreu uma precipitação de 0,8 mm. Contudo, com o aumento da intensidade da chuva, as diferenças nos coeficientes de escoamento entre as diversas coberturas vão ficando equivalentes.
No dia 1 de fevereiro ocorreu um evento de 9,5 mm, cujo coeficiente de escoamento superficial foi de 0,74% na cobertura com telhas de cerâmica. Esses valores são semelhantes ao obtidos por SILVA et al. (1988) para telha de cerâmica (Figura 2) e próximo aos valores recomendados para dimensionamento por GROUP RAINDROPS (2002). PRUSKI, et al. (2004), relatam que para o dimensionamento de área de captação com telhas de cerâmicas, deve-se ser considerados coeficientes de escoamento superficial entre 0,75 e 0,95%, contudo o valor médio observado durante o período para a cobertura com telhas de cerâmica foi de 0,76%.
O maior evento registrado no ano de 2008 foi de 81,0 mm no dia 1 de abril. Neste evento, os coeficientes de escoamento foram semelhantes para todas as coberturas, confirmando o fato de que nas chuvas de alta intensidade, há pouca variação no coeficiente de escoamento entre as superfícies estudadas. O valor médio do coeficiente de escoamento neste evento foi de 0,98%, portanto, valores superiores aos de 0,88% proposto por SILVA et al. (1988) e aos indicados por PACEY e CULLIS (1986), de 0,60 a 0,80%. Contudo, o coeficiente de escoamento superficial obtido para a cobertura com polietileno para estes mesmos eventos foi de 0,99%, respectivamente, sendo superior aos valores recomendados por SILVA et al. (1988) e TOMAZ (2007). Esses resultados demonstram que um aumento na intensidade da chuva, reduz o efeito do escoamento entre as diferentes superfícies de captação.
CONCLUSSÕES
A partir dos resultados obtidos, pode-se inferir que o coeficiente de escoamento superficial para as precipitações diárias apresenta baixa eficiência para as coberturas de argamassa de cimento e areia, como também para as telhas de cerâmica. As coberturas com telhas de fibrocimento e lona plástica de polietileno são mais eficientes no aproveitamento da água de chuva para as condições do semi-árido brasileiro. Um aumento na intensidade da chuva reduz as diferenças entre o coeficiente de escoamento superficial dos diferentes tipos de área de captação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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GROUP RAINDROPS. Aproveitamento de Água de Chuva. Ed. Organic Trading, Curitiba, PRCuritiba, 2002 London. Intermediate Technology Publications. 1999. 335p.
MEIRA FILHO, A. S.; NASCIMENTO, J. W. B.; LIMA, V. L. A.; SANTOS, J. S. Desenvolvimento de um modelo de captação de água de chuva para o semi-árido do Brasil. Engenharia Ambiental – Espírito Santo do Pinhal, v. 6, n. 1, p. 121-136, jan/abr 2009.
MOURA, M. S. B. de; GALVINCIO, J. D.; BRITO, L. T. de L.; SILVA, A. de S.; SÁ, I. I. de; LEITE, W. de M. Influência da precipitação pluviométrica nas áreas de captação de água de chuva na Bahia. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE CAPTAÇÃO E MANEJO DE ÁGUA DE CHUVA, 6., 2007, Belo Horizonte. Água de chuva: pesquisas, políticas e desenvolvimento sustentável: Anais…. Belo Horizonte: UFMG, 2007. 1 CD-ROM.
PACEY, A.; CULLIS, A. Rainwater harvesting: the collection of rainfall and runoff in rural areas. London. UK. Intermediate Technology Publications. 1986. 216p.
PRUSKI, F.F.; BRANDÃO, V.S.; SILVA, D. D. Escoamento superficial. Editora UFV. 2ª Ed. 87p. 2004.
SILVA, A. de S.; PORTO, E. R.; LIMA, L. T. de; GOMES, P. C. F. Captação e conservação de água de chuva para consumo humano: cisternas rurais; dimensionamento; construção e manejo. Petrolina: EMBRAPA-CPATSA, 1984. 103 p. il. (EMBRAPA-CPATSA. Circular Técnica, 12)
SILVA, A. S.; BRITO, L. T. L.; ROCHA, H. M. Captação e conservação de água de chuva no semi-árido brasileiro: Cisternas rurais II, água para consumo humano. Petrolina, PE, EMBRAPA-CPATSA/MINTER-SUDENE, 1988. 80 p. il. (EMBRAPA-CPATSA. Circular técnica, 16).
TOMAZ, P. Aproveitamento de água de chuva para áreas urbanas e fins não potáveis. In.: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE CAPTAÇÃO E MANEJO DE ÁGUA DE CHUVA, 6., 2007, Belo Horizonte. Água de chuva: pesquisas, políticas e desenvolvimento sustentável: Anais…. Belo Horizonte: UFMG, 2007. 1 CD-ROM.
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